
Décimo Passo
“Continuamos fazendo o inventário pessoal e, quando estávamos errados, nós o admitíamos prontamente.”
Se conseguimos chegar até aqui, é importante lembrar que esse é um processo de recuperação para todos os assuntos sobre os quais sabemos que estamos sem controle e nos fazendo mal. Se chegamos até aqui, podemos ver a história de nossa vida e perceber que temos um problema e precisamos de ajuda para resolver. É um processo, não um evento, mas só se eu quiser sair do isolamento.
John E. Burns, autor do livro O caminho dos Doze Passos: tratamento de dependência de álcool e outras drogas, chama a atenção para a importância da lista de pessoas que prejudicamos, para começarmos a reparar nossos erros e, dessa forma, restabelecer o relacionamento com elas. Volto a repetir a frase: “Quer saber qual meu relacionamento com Deus, pergunte qual é meu relacionamento com as pessoas ao meu redor.”
Os Passos não são para quem quer ser santo e, sim, uma oportunidade de crescimento espiritual, o que não tem nada a ver com religiosidade. No Terceiro Passo insistimos numa espiritualidade e num conceito prático de poder superior que funcione no dia a dia, que nos ajude a ir perdendo o interesse pelas coisas do ego, saindo do “eu” para o “nós”, e ganhando interesse pelos nossos semelhantes. O medo de gente, as desconfianças, nossas inseguranças financeiras nos deixarão.
Prestar atenção nas nossas qualidades e defeitos, nosso lado sombra e nosso lado luz, como rotina de autoexame, aceitando e se comprometendo em mudar o que está mal já é o caminho da espiritualidade. Aqueles que vivem de ressaca moral ou física estão impedidos de se ver. Há uma cegueira regida pelo medo, por um acúmulo de emoções negativas. Ninguém quer ver ou perceber seus sentimentos de rancor, ressentimentos, ciúmes, inveja, e tantos outros. Então, para encontrar serenidade, temos que eliminar essas ressacas. Como fazer isso cabe a cada um, e não é para se tornar um autoflagelo!
O inventário-relâmpago é de grande valia para sossegar as emoções tempestuosas. Ele visa nossas variações de humor diárias, principalmente quando pessoas ou acontecimentos nos desequilibram e nos levam à fragilidade emocional. Uma explosão de mau gênio pode estragar nosso dia, o dia dos outros, e criar gatilhos para nossas compulsões. Lembrando que as pessoas mais atingidas pelo ressentimento são os alcoolistas. E estes, na opinião deles mesmos, têm sempre razão. Ficam num estado de “porre seco”, em total desequilíbrio.
Então, primeiro devemos desenvolver o autodomínio para não falarmos e agirmos precipitadamente. Senão, nossa capacidade de sermos justos vai para o espaço. Respirar, pensar, deixar para outra hora, outro dia, são sempre as melhores opções. Se agirmos por impulso, emocionalmente, podemos machucar, ofender, acabando por estragar relacionamentos importantes ou mesmo pessoas desconhecidas. Se recairmos é porque estamos aprendendo, não vamos desanimar. Estamos em busca de aperfeiçoamento, não da perfeição.
Vou contar aqui um exemplo muito simples de uma prática quase diária que vem me mostrando que não é nada fácil prestar atenção em meus comportamentos e me controlar: com caixas de supermercado, ao telefone com planos de saúde ou empresas de telefonia, perco a paciência, o senso de justiça e a educação. Mas já estou conseguindo voltar atrás, abaixar o tom e pedir desculpas (só estou xingando os robôs). No início, foi muito difícil. Ainda perco a paciência, mas consigo respirar, perceber e me reparar. E como tem sido bom!
Dessa forma, fazendo um exame meticuloso de nosso dia, os bons e os maus acontecimentos e comportamentos (incluindo pensamentos), passamos a ter gratidão. Com esse sentimento no coração e na mente, dormimos bem tendo a consciência tranquila e em paz. Com esses sentimentos, sinto alegria de viver e estou pronta para ser uma pessoa melhor no dia seguinte.


