Uma história de codependência: CLAIRE
- Stella Rebecchi

- 12 de fev.
- 2 min de leitura
Atualizado: 17 de fev.

Não há nada mais dolorido do que ver alguém bem próximo, como uma filha, se destruir aos poucos. Ver uma filha com nosso cheiro, nosso sangue, saída de dentro do nosso corpo, parar de sorrir ou rir de verdade. Parar porque a vida se tornou um tormento, uma prisão em liberdade, uma mentira, um sufoco tão grande que nem a fuga para lugar nenhum resolve. A dor dessa mãe também pode ser a de um pai, a de um amante, ou a de um amigo.
Esta é uma história, mais uma história de susto, dor, desespero e impotência. Porém também a descoberta de como grandes mudanças, de dentro e de fora, na chuva e no sol, podem trazer à vida o gosto de ser vivida.
Claire, que desde muito criança já mostrava seu brilho, inteligência, charme e beleza, era pura música e poesia. As pessoas ao redor viviam encantadas com sua perspicácia, sedução e amorosidade. Cresceu cercada de admiração.
Sua família era mais ou menos normal, mais ou menos funcional, mais ou menos amorosa, mais ou menos rica materialmente, quase tudo mais ou menos. Claire era muito educada, tinha um belo pai, dedicado ao trabalho e ao poder, rígido consigo e com filhos, exigente, preconceituoso, egocêntrico. Uma bela mãe, ativa, simpática, controladora, sociável, filantropa, pouco amorosa. Todos com seus hábitos, exagerados ou nem tanto, seguindo a educação esmerada da época e dos costumes.
Claire tinha quase tudo.
Amor? Quem sabe? Mas o amor nunca é, e nem será suficiente para os serezinhos nascidos na Terra. Serezinhos incompletos imperfeitos na busca pela felicidade. Ninguém se livra da dor e do sofrimento enquanto não escolher e seguir o caminho de quem sou eu e o do coração.
Claire começou cedo a querer sentir mais alegria, a voar sem asas, sentir poder, agradar e ser agradada, se amar e amar. Um teco aqui, outro ali, um shot de uísque, outro de vodka, mais outro de gim, e mais outro. Até mudar para vinho mais barato e a garrafa maior, depois a lata de cerveja, mais um teco. Até descobrir que os goles e tecos estavam ficando poucos e que o buraco era muito mais fundo. Até descobrir que o amor é a coisa mais linda e difícil do mundo e perceber que começou a perder o pé na água cheia de lixo das enchentes de sua cabeça.
Enquanto isso, a mãe de Claire achava poder tudo, sofrida, que nem marido tinha mais para dividir sua preocupação. Perdeu a voz, o poder, o comando, a esperança. Perdeu o cabelo, se entupiu de doces, colecionou dores, matérias de revistas, jornais, livros que ensinavam o quê e como fazer para ajudar sua filha, quando a pessoa que mais precisava de ajuda era ela.
Finalmente se rendeu. Controlou o orgulho, a vergonha, a teimosia, pediu ajuda. Começou, então, o longo e eterno caminho de sua própria recuperação.
A recuperação da codependência.






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